segunda-feira, 18 de julho de 2011

EM CONCURSO DE MODA, ESTUDANTES CRIAM ROUPAS ADAPTADAS PARA DEFICIENTES

"Objetivo do concurso é incentivar a produção específica para este público, que ainda é muito mirrada no Brasil

Luisa Bustamante

Sob a máxima do “seja você mesmo”, a indústria da moda aposta frequentemente na ideia de que ter um estilo próprio é fundamental para o consumidor. Ironicamente, é justamente neste cenário que a falta de roupas adaptadas para deficientes físicos permite que o improviso e os gastos extras com costureiras se tornem companheiros diários daqueles que, por obra do destino, perderam a visão ou a mobilidade.
Com o objetivo de dar luz ao problema que atinge, segundo o Ministério da Saúde, cerca de 16 milhões de pessoas no Brasil, um concurso de moda premia, anualmente, estilistas com projetos de vestuários adaptados. A iniciativa da Secretaria de Estado dos Direitos das Pessoas com Deficiência de São Paulo está em sua terceira edição e encerra suas inscrições nesta hoje, 15 de julho.
Segundo a coordenadora do projeto, Daniela Auler, com o crescimento de vagas para deficientes físicos no mercado de trabalho aumenta também a necessidade de encontrar marcas que produzam roupas mais práticas e confortáveis. Daniela explica que, dependendo do tipo de deficiência, alguns modelos de vestimentas podem até prejudicar a saúde. “No caso de um cadeirante, os bolsos ou costuras nas calças podem fazer pressão na cadeira e provocar feridas ou escaras”, conta. “Além disso, não faz sentido ter um bolso na parte de trás da calça, então o compartimento deveria ser costurado na coxa.”
A coordenadora também cita as roupas com bordados em braille, indicando o tamanho e a cor das vestes nas etiquetas. “Uma vez uma participante fez um vestido todo bordado em braille e com aplicações em alto relevo, assim a pessoa poderia identificar o que está escrito na roupa que vai comprar”, acrescenta.
Vencedora do concurso no ano passado, a estilista Letícia Nascimento criou uma coleção específica para cadeirantes. Mesmo sem ter contato com ninguém que fosse deficiente, ela conta que se interessou pelo assunto no início da faculdade, durante uma aula, “a partir de então, eu comecei a pesquisar”, lembra. “Ouvi deficientes, médicos e psicólogos e dediquei os últimos três anos de faculdade à pesquisa. Quando soube do concurso, eu já sabia o que fazer, foi espontâneo."
Ainda assim, as pessoas com deficiência são obrigadas a apostar no improviso na hora de se vestir. A própria coordenadora do concurso admite que as coleções não chegam ao mercado, porque “falta investimento”. Cadeirante há 30 anos, Diva Salinas lamenta não poder se vestir da forma como gostaria. “Há alguns anos eu tinha uma costureira que preparava os moldes para mim”, conta Diva. “Hoje, tenho que me limitar à usar só malha mesmo. O grande problema é encontrar o molde certo para cada pessoa, porque o corpo vai ficando deformado com o tempo. E mesmo assim, quando mando fazer os ajustes, o valor da peça acaba dobrando”.
As iniciativas de comercialização de roupas adaptadas ainda são muito tímidas no Brasil. É o caso das estilistas Júlia Sato e Inayê Brito, que lançaram a marca Lira Inclusiva, com a proposta de vender sob encomenda roupas para deficientes. No entanto, Júlia comenta que a dificuldade de produzir em larga escala e a falta de acesso das pessoas com deficiência ainda são grandes desafios. "As empresas ainda não têm a preocupação de se adaptar para atender esse público", analisa. "Além disso, há um problema estrutural, porque uma vez que as deficiências são muito específicas, não dá para produzir em larga escala".
Coordenador do Instituto Novo Ser, entidade que luta pelos direitos das pessoas com deficiência, Fabinho Fernandes afirma que prefere ficar no improviso. “Prefiro fazer os ajustes com meu alfaiate, Seu Azevedo, que me cobra mais barato”, afirma Fabinho, que resolveu, por conta própria, adaptar suas roupas. “Deixo as camisas de botão abertas até pouco menos da metade coloco uma argola no fecho da calça, para conseguir suspender o zíper”, acrescenta.
O concurso é aberto a profissionais de moda de todo o país, que estejam cursando o ensino superior ou técnico." (Fonte: Jornal do Brasil)

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